Tempos estranhos estes que vivemos no enredo de uma pandemia (infelizmente tão previsível) neste mundo globalizante em que voamos todos os dias a uma velocidade vertiginosa sem tempo, muitas vezes, para pensar, tão somente para agir (reagir).
No meio dos "quarentas" vejo me confinado (como milhões) a um exílio forçado e á limitação de acções e livres arbítrios que eram dados como adquiridos com o selo de propriedade absolutista de cada um de nós.
Os actos (outrora) banais das rotinas do dia a dia tornaram-se na sua remodelação pandémica uma força libertadora á qual me agarro como o ar precioso que todos nós respiramos. Ir comprar pão quente e fumegante, passear o Beiças para as necessidades caninas básicas ou fumar um cigarro rápido a olhar para o céu do futuro incerto, parecem-me manjares dignos de qualquer deus do Olimpo terreno.
A vida tal e qual como a conhecíamos foi suspensa momentaneamente, nas redes sociais do nosso (des)contentamento derramamos as fotos de almoços e jantares passados, de viagens majestosas e de grupos de amigos e famílias inteiras desfeitas fisicamente qual muro de Berlim universal (ou grande muralha da China...) que nos emparedou a todos.
Ao final da tarde fria e chuvosa a libertação da varanda e do jardim; leitura lânguida e atenta devorando um cigarro lento como o tempo congelado dentro do copo de vinho encorpado pelas nuvens que passam. Pés nus no chão frio mas a alma vestida com o sentimento forte que voltarei a trajar as roupagens de um passado recente onde nos tocávamos , beijávamos e se partilhavam copos e afectos no cheiro e odor da presença física e quente daqueles que iluminam o nosso mundo.